domingo, julho 23, 2006

Por que o consumidor está chorando?

artigo de Gisele Centenaro do Portal da Propaganda


Na palestra que apresentou na tarde desta quinta-feira, 13 de julho, em um dos auditórios da Faap, Chetochine iniciou lembrando que 90% de todas as estratégias de marketing e comunicação nas décadas de 70 e 80 tinham como objetivo promover o lançamento de produtos e serviços, convencendo os consumidores a experimentá-los; os demais 10% eram ações destinadas a fazer frente à concorrência, ou seja, convencer os consumidores a trocarem uma marca por outra. No mundo contemporâneo, porém, essa divisão está invertida: 90% de tudo que se investe em marketing e publicidade busca, como resultado, incentivar o consumidor a trocar as marcas de sua lista de aquisições pelas marcas das empresas fabricantes e anunciantes; enquanto apenas 10% dos mesmos esforços estão centrados em lançamentos. Eis uma das razões pelas quais o professor considera as teorias de Kotler (o marketing tracional) obsoletas.

Outros fatores, porém, o levam a essa constatação: a evolução do consumidor; a derrota das marcas, que não têm, hoje, a mesma força de persuasão da qual desfrutavam no passado, fundamentalmente nos países ricos; a hipercomunicação, a partir do surgimento de inúmeros canais de comunicação, dentre eles a internet e o celular; o fim da economia de demanda, substituída pela economia de oferta; e o fim do valor estratégico da necessidade.

Compete aos profissionais de marketing e comunicação, nesse cenário, lançar mão de estudos cuidadosos do meio ambiente e do comportamento do consumidor, atentando para “o erro de Descartes”, conforme salientado por Chetochine: “o homem não é racional; o consumidor é emocional”. Equivoca-se, entretanto, o publicitário que, em face desse raciocínio, deduzir ser a linguagem emotiva adotada pela propaganda a solução para velhos e novos problemas. Falar emotivamente às pessoas não é o suficiente se o emissor não compreender que “a situação (ou a realidade) é a percepção, portanto, percepção é realidade e realismo”. Se o mundo, na concepção de cada um, tanto é aquilo que vemos como aquilo que imaginamos, a percepção, para o mestre francês, é o meio do caminho e, conseqüentemente, o conhecimento que deve ser buscado em relação aos consumidores, motivo pelo qual ingressamos na era, segundo suas palavras, do “marketing da percepção”.

Ao “perceber” e “reagir” ao ambiente ao seu redor, aceitando ou rejeitando uma marca, os consumidores dos tempos atuais não miram mais, como antigamente, a satisfação de uma necessidade – essencialmente na faixa da classe média, residente em nações de economias desenvolvidas –, visto que, do mesmo modo que as empresas fabricantes raramente conseguem desenvolver produtos ou serviços com atributos verdadeiramente diferenciados, eles não têm mais necessidades objetivas que já não foram atendidas. Segundo Chetochine, o sucesso das chamadas “marcas próprias” das redes varejistas, com preços mais acessíveis e qualidade similar às das marcas personalizadas e de grande notoriedade, está atrelado a essa nova percepção dos consumidores: “se há recompensa, como a satisfação imediata, a marca própria me convém”. Por outro lado, cresce cada vez mais o anseio por uma recompensa “projetada”, virtualmente criada nas mentes dos consumidores, que pode levá-los a superar estados de frustração, desde que não acarretem obrigações.

Ao tentar inferir esse estado de frustração e aspirações sem conhecer profundamente os consumidores, as áreas de marketing e comunicação podem acabar enveredando no universo da “bobolândia”, como salienta Chetochine, para explicar o infantilismo do consumo e do consumidor. Para que isso aconteça, basta refletir, de modo superficial, sobre esse novo comportamento, que pressupõe o querer tudo agora, um clima de Páscoa eterno, a abundância incontestável, proteção sem proibições, envolvimento sem obrigações, afeto incondicional etc., pois é inegável que o caos contemporâneo esteja provocando, nas pessoas, um desencanto do mundo e até o cansaço de sermos quem somos.

Em síntese, “se o céu está vazio de Deus, de ideologia, de promessas, de referências, de prescrições”, os consumidores procuram novos caminhos para evoluir, mesmo que, incapazes de expressar suas pulsões, no sentido que Freud dá ao termo, se sintam frustrados. Por sua vez, ao imergirem, de fato, nas camadas conscientes e inconscientes dos consumidores em seus respectivos mercados, as empresas e os profissionais de marketing e comunicação também evoluem, a ponto de aprenderem a fomentar grupos de consumidores evangelizadores que preguem em nome de suas marcas, estas ícones de produtos e serviços capazes de responder às frustrações, ofertando desfrutes sem obrigações.

Nesse contexto, se você for um profissional de marketing ou propaganda, não se pergunte onde está a ética de sua profissão. Deixe esse tema para outros campos exploratórios. “Não há ética em marketing. Nosso negócio é vender”, afirma Georges Chetochine.

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